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sexta-feira, 14 de janeiro de 2011



Deixo aqui um adeus, como tantos outros que deixamos por essa vida fora...



segunda-feira, 3 de janeiro de 2011

Type 0+ Negative

Eu não tenho nome. Eu não tenho rosto ou identidade. Eu nem sequer me imagino, e juro-vos que por vezes tento mesmo – isso de me imaginar com um corpo. Basta-me. Eu não tenho voz que se ouça, apenas projecto sons que se abafam e que se atropelam uns aos outros, uma e outra vez, em desfilar contínuo e imparável. Sim – projecto no vazio. Basta-me. Eu não falo como vocês. Falo no que não fui e no que vou ser – falo do nada. Que ser? Eu vou assim pelas ruas. Risco muros e edifícios velhos com pedaços de giz branco, traço linhas paralelas aos passeios porque não me quero perder quando me encontrar. Digo, também, que a graça da coisa é esta – a graça é não saber quando isso acontecerá. Basta-me. Por não ter voz. Eu atiro pedras ao rio. Escolho-as meticulosamente para que não se afundem mas erro-me, até as mais bonitas se afundam. Todas aquelas que escolhi. Todas elas se afundam; antes – digo-vos - despedem-se, salpicando os meus lábios com um ou outro pingo de água doce com sabor a lágrima. Basta-me. Eu digo coisas às pessoas mas as pessoas não as ouvem – porque não as digo. Tudo o que de maior queres ouvir nunca ouves de quem querias ouvir - eu queria ouvi-las da vida. Eu escrevo sem saber escrever e ler. Se eu ao menos soubesse ler, achas que poderia comprar um livro? É isso. Aqui me sento a ler o que não sei ler. Enterro o corpo na relva fresca e decapitada, olho para a ponte, ferros e cabos como grilhões – aços como prisões. Olho – basta-me. Para as velas que se agitam ao longe. Para os bancos abandonados e vazios de amantes de mãos dadas. Para as casas. Para as flores. Para as pessoas. Se tivesse voz, podia contar a história de alguém que nem sequer rosto tem.